Vice-campeã do grupo de acesso no ano passado, a tradicionalíssima Sereno de Cachoeiro retorna ao grupo especial contando a história de luta e resistência da princesa Zacimba Gaba
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Título do enredo: “ZACIMBA GABA!”
Confira a sinopse:
Nossa águia guerreira voa pela história esquecida (ou renegada) do nosso Brasil.
Brasil que esconde seus heróis, principalmente aqueles que se notabilizaram, em seu tempo, por se revoltarem com as tantas injustiças e absurdos legalmente estabelecidos. Brasil tão rico de heróis de negra cor esquecidos nos porões da História Oficial, mas que não valoriza lutas reais travadas em favor da liberdade.
Voaremos até a Mãe África, onde em terras de Angola, mais precisamente em Cabinda, no Séc XVII, nasceu uma linda princesa, iluminada pelos Orixás, que desde cedo aprendeu a amar e defender seu povo. Seu nome é quase um brado: Zacimba Gaba.
A menina cresce em beleza e força. Amada por seu povo, defendeu sua terra quando as naus invasoras aportaram na costa para roubar suas riquezas e aprisionar seus filhos. Liderando os exércitos, Zacimba parte para a batalha contra os portugueses com garra e furor. Porém o inimigo é mais forte e seu povo é derrotado na batalha, seu exército é dizimado e os sobreviventes são aprisionados. Zacimba Gaba, a princesa guerreira é aprisionada com os seus e mandada para uma terra distante, além-mar: Brasil.
Triste travessia pelo mar. Medo, morte, chibata… sob os grilhões, no porão do navio, via sua terra sumir no horizonte, e o mar se tingir de sangue de seus irmãos. O mar é a tumba de sua gente, ou seriam suas ondas a libertação final de sua dor?
O tumbeiro chega ao Porto de São Mateus, na Capitania do Espírito Santo. Zacimba Gaba, e mais 12 de seu povo, foi vendida como escrava ao fazendeiro português José Trancoso, rico proprietário de terras no vale do rio Cricaré. Mal sabia ele quem era a bela negra que comprava, mas não demoraria muito para descobrir que ali não estava nenhuma mocinha frágil.
No trabalho na fazenda, Zacimba constantemente era castigada por não cumprir as ordens (e caprichos) do senhor e do capataz. Sem abaixar a cabeça, não revelava sua identidade, muito embora o tratamento diferenciado que recebia dos demais escravizados já começasse a chamar a atenção. A negra princesa era reconhecida na senzala pelos seus, que lhe tratavam com reverência, mas sem revelar que aliestava a Princesa de Cabinda.
Desconfiado com tratamento que os negros davam à Zacimba Gaba, o fazendeiro Trancoso faz conduzirem-na à sua presença. Interrogada, ela nada diz. A fúria toma conta do senhor e este manda acorrentar e açoitar a princesa. Por dias e noites, a chibata marcou o corpo de Zacimba, até que esta, com altivez, confessasse: SIM! EU SOU ZACIMBA GABA, PRINCESA SOBERANA DE CABINDA!
Satisfeito com a confissão, Trancoso viola o corpo de Zacimba Gaba.
Reunidos os negros em frente à Casa Grande, Trancoso dá a ordem: Já sei do segredo de vocês e aprisionei sua princesa. Se houver algum levante, ou se alguma coisa acontecesse com sua família, ela pagará com sangue.
Os dias que se seguiram foram de dor e tristeza. Enquanto os castigos aos escravizados no campo dobravam, na casa grande Zacimba era torturada e violentada dia após dia. S
Mas a dor é a semente da revolta!
Naquele tempo, era famoso entre os negros um veneno sutil, mas mortal chamado “amansa sinhô”, que, ingerido em pequenas doses, não causava efeitos visíveis. Somente se fosse ministrado durante muito tempo ele levaria à morte. Este veneno era feito da cabeça de uma cobra muito encontrada na região do Vale do Cricaré, conhecida como Preguiçosa. Cortava-se a cabeça da cobra que, depois de torrada e moída, tornava-se um pó fino que se misturava na comida do senhor, que nada percebia de diferente. Mesmo os negros que eram obrigados a provar a comida do senhor antes deste comer não sentiam efeitos. Valendo-se deste poderoso veneno, Zacimba Gaba aguardou por anos o momento de sua vingança. Sob suas ordens, as mucamas envenenaram a comida de Trancoso dia após dia, ano após ano.
Enfim o dia tão sonhado chegou! Trancoso começou a se sentir mal e a sangrar por todos os lados. Mal houve tempo de socorrê-lo: o senhor estava morto!
Zacimba então, de facão em punho, conclamou seu povo que se levantou em revolta e a Senzala, enfim, invadiu a Casa Grande. Um a um, os torturadores foram mortos, cobrindo a fazenda de sangue, numa grande batalha contra os capatazes! Somente a família de Trancoso, foi poupada. Zacimba fugiu com seu povo pela mata adentro e fundou um quilombo onde hoje, se encontra a Vila de Itaúnas, no litoral norte capixaba.
No quilombo, Zacimba reinava como soberana, não esquecendo a dor de seus irmãos africanos. Na costa, montou um mirante de onde vigiava a chegada dos tumbeiros que vinham de Porto Seguro com destino ao porto de São Mateus. Na calada da noite, Zacimba Gaba e seus guerreiros navegavam em canoas e atacavam os navios ainda em mar aberto para libertar os negros recém-chegados. Contam os antigos que a visão daquela mulher poderosa em pé sobre a canoa causava medo, pois ela parecia sair da lâmina d’água, como uma visão fantasmagórica. Tomavam de assalto os navios e libertavam os escravizados antes de chegar à costa. Lutaram também em terra, liderando revoltas pelas fazendas da região e até mesmo em pleno Porto de São Mateus.
E foi numa destas lutas contra os tumbeiros que a Princesa partiu para junto de seus ancestrais, enquanto invadiam um navio português. Como um raio na escuridão, seu corpo tombou e caiu no mar. Nos braços de Iemanjá, Zacimba parte para o Orum, de onde continua a inspirar novas princesas negras que lutam pelos seus irmãos e irmãs.
Sua luta ecoa nas comunidades, nas vielas, nas universidades, onde se luta por liberdade, dignidade e alforria.
Onde se é RESISTÊNCIA, Zacimba Gaba vive!