Carnaval Virtual 2023 – “Entre nós, um segredo – A África que nos habita” é o enredo da Sampario para o Carnaval Virtual 2023

Completando 10 anos de história a Sampario vem mostrar sua força e lutar pelo campeonato. Para isso apresentará o enredo “Entre nós, um segredo – A África que nos habita”, que foi escrito e será desenvolvido pelo carnavalesco Wendel Santos.

Confira a entrevista concedida pelo presidente, Luiz Henrique:

1- Como conheceu a LIESV e por que a escolheu?

Conhecemos a LIESV através do Grupo JIO, aonde em um dos tópicos de debate do grupo comentamos sobre criar uma escola de samba real e começamos a “fabular ideias” foi aonde o João Salles Neto nos apresentou a LIESV e demos início ao projeto da Sampario.

2- Qual a história da sua escola, como e onde foi fundada, qual o motivo, quais as cores, símbolo e nome?

O Grêmio Recreativo Escola de Samba Virtual Sampario surgiu dia 26 de Janeiro de 2013 dentro do grupo JIO no Facebook, a escola tem sede em São Paulo, as cores são Azul e Branco e temos como símbolo a Águia, a escola tem como inspiração a Nenê de Vila Matilde.
Como dito, surgimos através de uma ideia aonde membros do JIO comentaram sobre fundar uma escola de samba, e como isso era impossível de acontecer na “vida real”, o João Salles Neto, presidente da LIESV e dono do Jio nos deu essa ideia e esse ano vamos para nosso 10º ano dentro da LIESV

3- Qual será o enredo da sua escola e como ele será contado na passarela virtual (quantas alas, alegorias e demais elementos)?

A sampario celebra seus 10 anos com um enredo que busca explorar um pouco da cultura tradicional da África ocidental, tendo como pano de fundo a ideia de memória e de tradição oral.

O texto tem como referências principais, os livros “Amkoullel, o menino fula”, do autor malinês Amadou Hampâté bâ, e o livro “O mundo se despedaça “, do escritor nigeriano Chinua Achebe.

O enredo se divide em 28 alas, 5 alegorias, 2 casais e 2 destaques; divididos em 5 setores, pautando as ideias de 1- Tradição; 2- Glória; 3- Resistência; 4- Legado e 5- Memória.

É uma África rica em cultura, de pessoas simples para o mundo, mas que tem grande valor e importância para o seu meio social, e que principalmente, é de extrema diversidade, diversidade que se respeita em cada detalhe, entre tantas diferenças que cada “país”/pessoa possui, se respeita e se completa. Como no Ubuntu, sou porque somos, e o Sankofa dentro de uma perspectiva de valorização e retomada.

E a Sampario/A nossa África, só existe porque cada um de nós que aqui colabora existe. Porque cada um do grupo de amigos que temos, existe.

4- Como a equipe da sua escola foi montada e quem faz parte dela?

Como sempre falamos, a Sampario é formada por amigos e especialmente nesses 10 anos a gente irá manter o time do último carnaval e de quebra teremos ex membros da escola ajudando na organização do desfile

Presidente: Luizinho Sampario
Vice Presidente: Vinicius Marques
Carnavalesco: Wendel Henrique
Direção de Carnaval: Fernando Constâncio, Victor Alves, Izaias Júnior e Gleison Maurício

Intérprete: Bruno Ribeiro

5- E o samba enredo, vai fazer eliminatórias de samba ou vai encomendar? Se for eliminatórias, quais as regras da disputa, pra onde os compositores devem mandar os sambas e etc?

10 anos de Sampario será todo em prol da amizade, por isso o samba será criado pelos membros da escola e pessoas que estão ao nosso entorno nesses anos.
Para o ano que vem pretendemos retornar as eliminatórias que paralisamos nos últimos anos.

6- O que você e sua escola esperam do Carnaval Virtual 2023, tanto de vocês quanto das coirmãs?

Sampario deseja a todas coirmãs um excelente pré-carnaval e que todas consigam preparar seus desfiles sem nenhum problema, que tanto no Grupo Especial como no Acesso as escolas apresentem um nível de carnaval à altura que a LIESV merece e que juntos possamos realizar os maiores desfiles que o Carnaval Virtual já viu

Confira abaixo a logo e a sinopse do enredo da Sampario para o Carnaval Virtual 2023:

Introdução:

O carnaval e a escola de samba são, de certa forma, exemplos do culto à memória.

As homenagens, os sambas de exaltação, ou que falam de história, são, sobretudo, parte da memória do sambista e do povo preto.
O batuque, em sua essência, também é parte dos domínios da memória, uma vez que os tambores que ecoam em África, também ecoam em nosso Brasil, e dão ritmo às diversas manifestações artísticas e religiosas que compõem a cultura popular nacional.

Neste contexto, ao celebrar seu décimo aniversário, o Grêmio Recreativo Escola de Samba Virtual Sampario, faz um breve passeio pelo universo da memória pautado na filosofia africana e ancorado na tradição e na oralidade.
Falar sobre memória certamente esbarra em muitos outros temas já abordados no carnaval. Portanto, nossa águia se põe a voar por temas e ideais em uma viagem entre mundos, onde as fronteiras entre passado e presente se diluem, onde valores e conceitos ligados à questão ancestral da áfrica negra se unem com o intuito de valorizar a cultura negra e africana. Seja a simplicidade da vida cotidiana, ou a glória de impérios; o infeliz capítulo da escravidão ou a filosofia do pássaro Sankofa. O samba é parte da memória, e nossa águia parte para celebrar uma década de trajetória nas telas do carnaval virtual.

Sinopse:

Setor 1 (abertura): Tradição
Ecoa, em pleno território africano, um velho atabaque para anunciar o início de mais uma viagem de nossa águia altaneira, em mais um carnaval. Na imensidão deste nobre território, onde os limites da história, da memória, da filosofia e do misticismo se diluem, reencontramos os antigos caminhos da tradição oral, do culto aos espíritos e forças da natureza, onde o povo vive a partir daquilo que crê e onde nunca se é sem as memórias e as honras daqueles que já se ancestralizaram.
E assim, nos domínios que compreendem a cosmogonia da memória, a cronologia se coloca em suspensão. Passado e presente se unem intimamente, de forma quase intemporal, confundindo as mentes ocidentais mais desavisadas. O passado se faz vivo, através de seus muitos rastros, que ainda ressoam intensamente em nosso presente. Nos colocamos assim a reencontrar as muitas Áfricas que residem em um mesmo território, por caminhos muito além dos registros temporais.
Nessa peregrinação, somos levados ao encontro da sabedoria dos djelis1
, aqueles que guardam em si o dom e o poder da palavra e que versam por meio de antigos provérbios. A sabedoria milenar dos djelis, sentados aos pés das árvores semeadas onde descansam nossos antepassados, nos ensina o papel quase divino da memória e da palavra para quem o saber é uma luz que existe no homem, constituído enquanto herança de tudo aquilo que nossos ancestrais puderam conhecer e que se encontra latente em tudo o que nos transmitiram, assim como o baobá já existe em potencial em sua semente. Lado a lado com nossa águia guerreira, nossos guias nos contam os segredos dos antigos rituais, onde a memória e a palavra são presentes de caráter etéreo, ofertados aos homens, de forma que possibilitaram a formação de gloriosas civilizações.

Setor 2: Glória
Ao reencontrarmos a tradição da memória e da palavra, nos colocamos a olhar de frente o papel da memória entrelaçado ao registro da história, intimamente 1 Dieli é uma palavra da língua bambara, falada pelo povo africano que habita principalmente as regiões do Mali, Senegal e Guiné-Bissau, e que quer dizer “sangue”; e a circulação do sangue é a própria vida, como a palavra que circula (SOARES,2013). Corresponde ao francês Griot. (Ver Amadou Hampâté Bâ, 2021, p.11) entrecruzados assim como as tramas que compõem os tecidos2 de alaká, provenientes da costa ocidental africana.

É no gesto de olhar para a trajetória dos filhos de mãe preta, que nossa águia se depara com os lugares de memória. Seja nas terras vastas de um continente, seja nos corpos marcados daqueles que por ali passam, ou nas ruínas das glórias de grandes impérios. Está na memória, gravada na pele enquanto documento, a imortalidade e a grandeza do continente africano. Estão presentes no DNA do povo de pele preta às tradições e os conhecimentos passados de geração em geração, que nem as areias do deserto foram capazes de apagar.

Contudo, ao bater suas asas, nossa águia altaneira redescobre a memória de reis e rainhas, dos fulas ou toucouleurs de Bandiagara, dos iorubás, daomeanos (jejes), bantus e nagôs, de Angola, do Congo e do golfo de Benim. Ou ainda, das dos ibós e demais povos que habitam as margens do delta do Níger. Dos ashantis, os mais populares dentre os akans. E também dos povos do Kemet3 e Kush4, que prosperam com gloriosas civilizações nas planícies inundáveis do grande Hapi.5 Glórias que ultrapassam milênios, cruzam mares e espalham um extenso legado pelo mundo, e que resistem aos mais infelizes capítulos da história da humanidade.


Setor 3: Resistência
No trilhar de nosso caminho, somos atingidos por ventos secos e frios como o
harmatã6 , que carregam consigo além das finas areias dos desertos que cobrem a África ocidental, memórias de tempos sombrios, despedaçadas pelas mãos 6 Vento seco e frio, carregado de areia muito fina, que sopra do deserto do Saara sobre as savanas, os cerrados e as florestas da África Ocidental (ver ACHEBE, 2009, p.234)

5 Como o Rio Nilo era denominado no antigo Egito.
4 Atual Núbia.
3 Nome atribuído ao território que viria a compor o que conhecemos como Egito, anterior a colonização Grega.
2 O tecido simboliza a história do povo africano; certos tecidos têm significados especiais: na tradição peul, por exemplo, um tecido dobrado significa o passado. (N.T.) (ACHEBE, 2009, p.25).

Muitos dos produtos exportados dos países e territórios da costa atlântica do continente africano ficaram popularmente conhecidos como da costa, como por exemplo a palha da costa, os búzios da costa e o pano da costa, originalmente chamado de alaká, e que compõem a indumentária tradicional da baiana. (LODY, 2015, p.33) gananciosas dos toubab7. Impondo seus costumes, crenças e suas próprias noções de civilidade, despedaçaram o mundo e arrancaram do seio de sua mãe preta, os filhos de África.
Contudo, a ignorância dos toubab foi, por muitas vezes, capaz de subestimar a histórica capacidade do povo preto de não apenas resistir, mas de RE-EXISTIR. De se manter firme como as raízes de um baobá. Nossos mais velhos dizem que o sol brilhará sobre os que permanecem de pé, antes de brilhar sobre os que se ajoelham. A resistência, e a capacidade de se manter existindo, ultrapassando os limites lógicos impostos pelo colonialismo, sempre se constituíram enquanto valores fundamentais na formação de cada povo e cada indivíduo desta vasta terra milenar.
Ao voar e reencontrar as memórias deste infeliz capítulo de nossa memória,
chegamos à encruzilhada onde Brasil e África se misturam, como o encontro entre dois mundos, o culto aos ancestrais se manifesta e une para toda a eternidade territórios e memórias separadas por um Atlântico inteiro de diferença. É o sangue e a sabedoria do continente mãe, que constrói o “novo mundo”. É no encontro desses caminhos e histórias que nos deparamos com fluxos e contrafluxos. Fluxos daqueles que vieram, mas que jamais voltaram; e contrafluxos, daqueles que vieram, mas que não hesitaram em lutar para voltar.
É em solo brasileiro onde surgem os principais expoentes da memória e tradição africana, manifestados através da formação dos quilombos, enquanto resposta aos horrores da escravidão e do colonialismo. É nos quilombos onde o negro reassume os papéis de autor, narrador e personagem de sua própria história. Onde a ancestralidade se manifesta novamente, em meio aos gestos, danças, rezas, cultos, tensões e política. Onde reconstitui sua soberania, e a ancestralidade e a memória se tornam resistência.

Setor 4: Legado
7 A palavra toubab (“doutor” em árabe; singular: toubib) é utilizada na África para designar os europeus, tanto no singular como no plural (ver BÂ, 2021, p.91) Nessa jornada, os caminhos da ancestralidade nos levam a olhar para o mundo e reconhecer os rastros de nossos antepassados, de forma a perceber que os frutos da soberania do povo preto se espalharam pelos cinco continentes, enriquecendo culturalmente o mundo. A glória da tradição africana se faz presente ainda hoje em nossa literatura, ciência, arquitetura, política e música, como pilares fundamentais de nossa cultura e sociedade.
Vivem pelo mundo os filhos da mãe África negra que se fazem presentes nas
referências de comunidades, famílias, segmentos religiosos, artesãos e culinaristas, presentes nas muitas manifestações, festas, práticas religiosas8
, técnicas artesanais, músicas, danças, autos, penteados, indumentárias, cores, estampas, adornos corporais, vocabulários, lendas, contos e mitos.
Dessa cultura em diáspora, formaram-se pequenas Áfricas, onde a memória e a ancestralidade renascem no olhar de cada criança negra, que reencontra sua identidade e pertencimento. Onde cada indivíduo renasce a cada colheita como parte de um todo coletivo, onde cruzam-se passado, presente e futuro. Onde o toque do tambor, o culto às forças da natureza e dos valores se fazem imortais, passados de geração em geração.


Setor 5: Memória
No final dessa viagem, marcada por encontros, reencontros e descobertas, nossa águia se depara com as muitas “áfricas” que a própria África não conheceu. Ao chegar ao Brasil, surge diante de teus olhos a glória das sementes que aqui germinaram. Reencontramos os mais puros laços que constituíram nossa história na última década. A memória coletiva, as relações de amizade, que construíram nossa identidade nos 10 anos dessa “brincadeira séria”.
8 Na África tradicional, com sua organização comunitária, não se pode falar em religião propriamente dita, pois todos os atos do dia a dia se relacionam com o conceito de força vital que anima os seres humanos: assim, o culto concerne a todos. Com a centralização do poder, quando do surgimento da
cidade-Estado ou em decorrência de rupturas internas da própria sociedade, como no caso da sociedade ibo, surge a figura de um responsável pelo culto, sacerdote ou sacerdotisa, que não tem atributos divinos. (N.T.) (ACHEBE, 2009, p.37)
É na filosofia do pássaro sankofa, que diz “volte e pegue”, que olhamos para o
passado e para o presente, e nos conectamos com a ancestralidade presente na magia que renasce a cada carnaval. É na memória que sobrevive a tradição, imersa em um universo invisível, porém vivo, constituído de forças em perpétuo movimento.
Um movimento constante, um movimento popular, que se constitui na força da
coletividade daqueles que levam a vida com “uma dose de samba e amor no
coração” e transcende as diferenças e as grandes distâncias.
É no gesto de olhar para sua trajetória que nossa águia se depara com os lugares de memória. Seja nas terras vastas de um continente, seja nos corpos marcados daqueles que por ali passaram. É imortal a grandeza do continente Africano. Está presente no Okan9 de nossa gente. Marcado na tradição, na coletividade, na harmonia com os outros e nos valores de Ubuntu, que nos guiam na formação de uma “unidade” que nos diz “sou porque somos”.
Hoje, o quilombo está em festa e celebra sua pluralidade, sua identidade e, acima de tudo, as belas amizades que somente a loucura chamada carnaval pode proporcionar.

Salve, Sampario!

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